Você não vai acreditar, mas o Derek ainda não é fluente no português. Consegue se fazer entender, mas fala só o que quer e quando quer.
Em compensação, desbloqueia o iPad, procura jogos e vídeos, escolhe o preferido e assiste feliz, mesmo que seja em russo. Pra ele, o mundo é uma grande tela sensível ao toque. Pra abrir a porta de correr do nosso living, ele para na frente, toca e arrasta o dedo devagar. Ah, o mundo e suas maçanetas…
Derek me ensina e me encanta com o olhar. Aprendo com ele e com meus alunos, todos os dias. Tem um deles que ando apaixonada. Ele não acha muita graça na minha aula, cumpre pouco os combinados e tarefas. Mas me abraça e diz que gosta de mim.
Todas as quintas-feiras, almoçamos juntos. É neste momento que me fala do sítio da avó e sobre uma casinha que ele tem lá. Com TV, máquina de lavar e porteiro eletrônico com câmera colorida. Quer que eu passe um final de semana com ele, correndo pra pegar os abacates antes dos cachorros, colhendo as folhas da horta, andando até o lago e tomando banho de esguicho. E comendo muito alface com shoyo: “Minha babá diz que alface acalma, Bettina!”
Nunca havia ouvido uma criança falar sobre hidrômetro, relógio de luz, metros cúbicos e conduítes. Ele fala com desenvoltura e sabe sobre gastos e a função de cada coisa.
Um outro aluno me fez repensar o uso que damos às palavras. Nas portas da sala de aula está escrito: “Quando sair, apague a luz”. Todas as vezes que vai beber água ou ao banheiro, ele apaga a luz, não se importando se tem alguém lá dentro. O que ele lê, ele faz.
Outro dia os alunos comentaram que a lição de casa do professor de sala era ficar em silêncio e ver os sons que cada um ouvia. Sério, ele disse: “Não posso fazer. Eu não vejo os sons.” Ah, o mundo e suas entrelinhas…
Tem muitas histórias. Um ex-aluno querido é um encantador de plantas. Faz jardins lindos e fica feliz em fazê-los. Um menino do dedo verde. Outra querida sabe cenas inteiras de filmes, com todas as entonações e sonoplastias. Entretém os menores com suas performances.
Tenho pensado nestes tantos saberes não formais que nem sempre são valorizados. Pontua-se o fracasso, mas e as habilidades extraordinárias? Sofrem bullying? Cuidar e fazer crescer flores é menos importante que mol e alcalinos terrosos? Conversar com o avô que já morreu tem menos valor que conversar em uma língua estrangeira? Antes de saber de conduítes obrigatoriamente tem de se saber somar e subtrair?
A Silvia – não sei se você lembra dela, minha amiga e ex-professora dos meninos – abriu um espaço bem bacana, a Babel, justamente pra quem não possui todos os saberes escolares e por isso não se encaixa neste sistema conhecido de educação. Um olhar diferente pras diferentes formas de saber e aprender.
Ruben Alves escreveu que inteligência não é possuir todas as ferramentas. Inteligência é possuir poucas (para andar leve) e saber onde encontrar as que não se têm, na eventualidade de se precisar delas.
Vivemos num tempo imediato, com maçanetas emperradas e entrelinhas esquecidas. Acalmam-se crianças com remédios e não com pratos de alface. Claramente precisamos de transformações sociais. E espirituais. E ambientais. Então vamos precisar de todo mundo, um mais um é sempre mais que dois.
E acho que preciso de você, Ita. Que saberes existem no teu silêncio, na sua imobilidade, no seu aparente escuro interior? É só doença, falta, fracasso? É só isso? Ou existe uma sabedoria escolhida pra poucos?
Flavia, uma amiga querida, diz que o mais bonito desta nossa história é que você acordou o que em mim dormia! Sei que ainda tenho sono, mas quero mesmo acordar e enxergar um tempo melhor.
Querida Bê , que prazer deve ser essa sua profissão , estar sempre com crianças , elas nos ensinam muito mesmo , adorei esse seu aluno do alface…que graça!
Tive uma grande alegria esse final de semana, encontrei com o seu irmão Fabio por 2 dias em Maresias num evento, estávamos os dois a trabalho, adorei !! Agora quero encontrar com você ! Bjs e saudades
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Ah, que legal, querida! Ainda não encontrei com ele, mas certeza que vai me contar e foi uma alegria também! Quero ver vc! Beijo com saudades!
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Simplesmente maravilhoso!!! Dom de enxergar um universo nos comentários e ações dos alunos… Vou sentir falta!!!
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Ai, nem to podendo pensar no assunto que já choro, Mari querida! Parceira de equipe, amiga de todas as horas, te amo!
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Nossa Be,
educadoras como você, capazes dessa escuta sensível é o essencial para nos inspirar a continuar na batalha de sermos educadores.Obrigada pela citação…sempre que leio seus textos me emociono muito e saio cheia de inspiração
bjs mil
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Sil querida, citação merecida e profunda admiração! Bj grande
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Como eu amo as histórias dos seus alunos! Não é à toa que eles te amam. Você, como poucos, sabe escutá-los.
Te amo!
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Ah, Bubu, e vc é minha melhor ouvinte! Te amo tanto!
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Todo domingo, depois que leio seu texto penso: nossa esse foi o melhor!!! Bettina se superou!!
Mas aí chega o próximo domingo e você me surpreende ….. E eu penso: nossa esse foi demais…. É assim que termino meu domingo: sempre sem palavras que possam expressar o quanto você é uma amiga especial e que sorte eu tenho de ter vc no meu coração e na minha vida!
Hoje você arrasou …. De novo … Até o próximo domingo!!!
Te amo … Boa semana…. Paty❤️
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Paty querida que amo, vc sabe o quanto é responsável por esse meu caminho, não é? Vc nunca desistiu de mim, mesmo nos dias escuros quando eu estava “em coma”. Te amo por tudo!
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Meu Deus, como vc escreve maravilhosamente sobre crianças. Parabéns, como o mundo precisa de pessoas assim feito vc♥
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O mundo precisa de pessoas generosas como vc, Rosangela. Muito obrigada! Bj
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É sempre encantador e admirável ler seus textos, enriquecem o espírito.
Parabéns, Bettina!
Beijos.
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E é a sua delicadeza que me encanta, Ricardo! Obrigada. Beijo carinhoso.
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